quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

SENTIDO



Já pus o tacho no fogo, na despensa fui muita vez. E acabo de vir de novo! Mas tão oca quanto um ovo que se há de rechear para a Páscoa veio a concha destas mãos; que vazias só se perdem sem poder dar lume às achas.

E tão certo é o deserto aguardando pela chuva, que o vaso veio vazante de verbo com força de fé. Nem ao menos um morfema se esquentou nesta garganta, ou somou, vocabular. Quando o meu Deus não quer...

No tabuleiro de achados nem se deu por encontrar ingrediente, misturas que façam valer este dia.

Eis que o tacho, agora no fogo, aceso pelos que sabem (quanta coisa num livro cabe!), pôs o cobre a cobrar ardente o azeite da informação. Enquanto na sala o dom, meu especial convidado, aguarda do apuro o rescaldo; e eu sem fruto por refogar.

E saber que entre os mantimentos rescendentes de especiarias há fonemas que se oferecem concretos de alegoria: açúcar mascavo e pimenta, cardamomo, cravo, uva passa, anis estrelado de céu, morfologia picante, noz-moscada, leite, mel...

Vou me perder na cozinha. Jogar as rimas na frigideira. Ritmar na percussão do chiado. Nouvelle Cuisine, direi (mesmo antiga e ultrapassada).

Desagregado o mexido, pleno de vocábulo raro e cheio de entonação, precisa significado?

Iguarias sem iguais - sem irônica pitada, sem o metamorfosear múltiplo e inteligível, ardendo ao sabor farto de léxico sem alquimia, feito amálgama sem todo - prescindem de reter sentido e talantes de analogia...

Está servido?


autoria: Cecilia Ferreira

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